Na fronteira entre Minas e Rio, a meia hora de Juiz de Fora, temos a imponente Pedra do Paraibuna, no município de Mont Serrat (antigo Paraibuna). A pedra tem cerca de 500m de altura e cerca de 2km de extensão, de muito granito! A cidade é cortada pelo rio Paraibuna, que desce de Juiz de Fora e serpenteia a pedra, onde é comum a prática de rafting. Na pedra do Paraibuna em si, existe a opção de subir até o cume por trilha ou escalar a pedra até o platô de baixo por algumas vias. Existem duas vias que chegam até o cume, porém, são localizadas em um ponto onde há muito deslize de pedras e o acesso é proibido. Há vias curtas e o campo escola também, que são ótimos para praticar as técnicas de escalada.
A grande dificuldade da escalada na Pedra do Paraibuna é o calor. O grande Crux! Seja inverno ou verão, o ideal é começar bem cedo, pois o calor vai tornando a escalada quase insuportável. No verão, há algumas horas a mais de sombra pela manhã. O ideal, para escalar uma via mais longa, é esperar uma boa janela de tempo nublado, com temperaturas mais amenas. Outro pequeno e inconveniente podem ser carrapatos. E é bom olhar onde pisa, pois há cobras na região também!
A via C3PO é uma das vias mais clássicas do Paraibuna, com seus 225m, 8 cordadas, classificada como 5º VIIa A0 D2 (eu acrescentaria um E1), predominantemente de agarras e aderência, conquistada pelos escaladores Aranha, Birula, Camila, Gilmar, Helder Souza e Rodrigo Mitherofer.
Apesar de ter trechos com dificuldades técnicas um pouco mais elevadas, é uma via bem protegida e um ótimo treino de resistência e psicológico para paredes mais longas. É uma via que exige uma logística de água e comida pra levar pra cima (pelo menos uns 2l de água por pessoa vão embora fácil!)!
Apesar de já ter feito algumas investidas nela, somente cheguei ao “cume” (o platô abaixo do cume) duas vezes, a segunda vez sendo no último dia 2 de Novembro de 2024, com o amigo Rafael Mendes! A Primeira foi em 2022 com os amigos Conrado (o Montanha e Mato) e o Weber!
Assista abaixo o vídeo da primeira investida que fiz na via, com as amigas, em Abril de 2022, indo somente até pouco antes da p4!
A vez que fui com Conrado e Weber, os 3 queriam MUITO chegar naquele cume, que é a única forma de explicar como chegamos lá. Com condições totalmente adversas, começamos cerca de 9:30 da manhã, debaixo de sol, mas fomos revezando as guiadas e chegamos, ao pôr do sol. Como tínhamos 2 cordas, a descida, na ocasião, pela via Snake Protection, foi rápida. Nesta ocasião, no começo da 6ª cordada os pés já ardiam com a borracha queimando sobre a pedra quente, e em outra vez em 2023, que desci da P6, também. No último sábado demos sorte com o tempo no começo da manhã, e o sol foi nos pegar lá pro final da escalada, não senti essa queimação nos pés nessa cordada. Antes, eu não saberia dizer como eram a 6ª e 7ª cordadas, pois havia subido me arrastando, com os pés queimando. Escalar em 3 pessoas torna a via mais demorada e, quanto mais tempo na parede, mais difícil ela fica.
Eu, Conrado e Weber no platô final da C3PO, em 2022.
Enfim! Após alguns atrasos com calma, chegamos, eu e Rafael, no último sábado 02/11, pra escalar a via por volta de umas 8h e começamos mesmo umas 8:30. O dia estava nublado, alguns amigos de Juiz de Fora já estavam lá, escalando outras vias. Eu estava ansiosa que outra vez já desisti da via no começo em um dia ruim, mas Rafael quis começar guiando e sua animação e comentários como “nossa, que via gostosa!” me acalmaram, e entrei na vibe!
Rafael guiou a primeira cordada, um 4º grau com boas agarras, super de boas; guiei a segunda cordada, achava que era um 5º (achava que os graus das cordadas eram uma escadinha, 4º, 5º, 6º, 7a e 8a/A0, as próximas duas um mistério e a 8ª cordada um rampão de 2º grau.) Mas os graus corretos estão registrados no croqui abaixo, atualizado no site escaladas.com.br pelo Helder (valeu, Helder!!)!
A 3ª cordada da via é, na minha opinião, o crux da via. Com trechos de Vsup e V de aderência, foi nessa primeira investida, do vídeo acima, que desbloqueei a escalada de aderência na mente, há uns anos atrás. Sem saber que era o crux, Rafael foi! Moretto descia de rapel numa via próxima e brincou que sou esperta, que deixei o pior para ele. Mas Rafael foi, na fé, e chegou na P3!
A 4ª cordada, o VIIa, acho menos pior que a 3ª cordada de aderência. As agarras dessa 4ª cordada são grandes e, apesar de precisar de um pouco de técnica e força para atravessar os lances, é bem protegida e dá pra artificializar em caso de dificuldade, como no vídeo acima, em minha primeira investida. Nessa ocasião, faltou da logística, pois ficamos sem comida e sem água, o que me deixou fraca e optamos por descer (e foi o timing perfeito pra chegar no chão e começar a chover).
A 5ª cordada é o artificial no tetinho (ou 8a, em livre). A vez com Conrado e Weber eu fui guiando ela; desta vez, Rafael guiou. Já estávamos cansados e o dia estava quente, o sol aparecia e escondia a essa altura. Ambos não estávamos com estômago para comer, mas dividimos uma bananada que foi a glicose que faltava em nosso cérebro para terminar a via. Rafael chegou na P5 já fraco e cansado, se eu não falasse que iria tocar pra cima, ele teria sugerido voltar ali. Mas, pela primeira vez, eu consegui * ver * a 6ª cordada, e fui!
Bananada na P5, a glicose no cérebro que nos faltava!
A 6ª cordada, que eu achava que era inescalável! Lembrava de uma saída numa aderência, mas não vi essa dificuldade do jeito que eu via antes e achei que ela era na saída da 7ª cordada, em vez da 6ª. Mas era o olhar sobre a via mesmo! De lance em lance, já cansada também, adrenando nos lances, indo de chapa em chapa, cheguei na P6!
Rafael chegou logo atrás, faltava um cordada para chegar no rampão, onde acabava a via. Estávamos cansados, mas nos hidratamos e olhamos para a via. Mais uma e era “cume”. O começo da cordada parecia que tinha uns lances tranquilos, e depois as chapas muito próximas uma da outra! “Acho que rola”, pensei comigo, mas Rafael, mesmo cansado, tendo dormido pouco na noite anterior, decidiu ir, na raça e na coragem! Quando chegou na P7 desabou a chorar. Era um sonho escalar a Pedra do Paraibuna, e estávamos ali! A última dificuldade técnica havia acabado!
Já para mim, de participante, comecei a cordada pensando “misericórdia Rafael, como vc subiu aqui”, parecia tranquilo, mas na hora achei ruim. É normal, de participante, eu ter dificuldade e não ver os lances da mesma forma que eu veria se estivesse guiando, por mais que me esforce em olhar com olhar de guia. Era uma transferência horizontal pra direita para começar a subir reto, quando quebrei uma agarra de mão e dei uma vacadinha pendulando no lance gritando “uhuul”, mas foi divertido e me endorfinou! A corda não estava tão retesada e caí abaixo de onde daria para roubar o lance, e fui obrigada a escalar (o que foi bom também, mas só queria chegar)!
Finalmente cheguei junto e toquei pra P8, o rampão, Rafael subiu junto e nos abrigamos embaixo de umas plantas espinhudas no cume para relaxar, curtir a vista lá de cima e comer direito, que só havíamos comido a bananada na P5! Nem exploramos muito o platô pois a vegetação estava bem alta e havia muito arranha-gato, que até mesmo na trilha da base nos arranhou tudo! A essa altura o sol já castigava, chegamos ao cume às 12:30! Mas valeu a pena cada esforço, cada dificuldade, cada vacilada, cada insistida!
Ficamos até 13h lá em cima, meia horinha só, e decidimos descer pela própria via. Afinal, teríamos 8 rapéis debaixo de sol para fazer ainda. No fim das contas, como estávamos com uma corda de 70m, fizemos somente 7 rapéis, como a via faz algumas curvas, foi possível pular uma parada e ir direto até a seguinte. Fui abrindo os rapéis, tirando a corda do meio dos cactos (Coleocephalocereus fluminensis, cactos escaladores de pedras que só existem no estado do Rio de Janeiro & Juiz de Fora), os cactos deixando micro espinhos em minhas pernas quando entrava no meio deles pra desagarrar a corda. Em 2h já estávamos no chão, no get, agradecendo pelo dia maravilhoso e a escalada incrível que foi aquela, já quase nem lembrando dos perrengues que passamos!
Eu e Rafael no final da C3PO
15:30 já estávamos tomando uma coca-cola gelada na padaria que é o point dos esportistas na cidade, ciclistas, galera do rafting, escaladores, trilheiros etc, repondo os sais minerais e tomamos um caldo de cana com limão na estrada de volta, passando por Cotegipe. 16:20 já estávamos no caminho de casa!!
Valeu a pena cada arranhado, cada desidratada, cada cansaço dessa via!
É uma via ótima para treinar várias coisas!! De agilidade com procedimentos, psicológico, técnica, resistência, é uma via completa e muito querida! O fato de ser bem protegida encoraja a escalada dos graus mais altos na via. C3PO é treinaço!
Já escalou essa via? Conta aí suas percepções!!
Está precisando comprar ou renovar seus equipamentos? Se liga na nossa lojinha aqui!
Deixe um comentário